O dormitório era incrível. Nossas camas eram decoradas com colchas de retalio amarelas, as paredes de cor amarelo-sol e os abajures com renda amarelo-claro. Ao contrário dos dormitórios normais, este era reto com as camas alinhadas uma ao lado da outra. O colchão, como era de se esperar, era macio de mais. A cesta de madeira que fora mencionada por Alfredo estava lá, com um cadeado roxo para ser trancada a qualquer momento.
Ana não possuía animal algum de estimação, e Fushka foi entregue à Argo Filch, o zelador. É claro que o gatinho odiava Filch, mas não havia outro jeito se não ir com ele.
A minha noite foi a melhor da minha vida. Sonhei com as coisas mais maravilhosas que alguém poderia imaginar, incluindo pudim de leite condensando e tortinhas de abóboras. Ana ficou com a cama ao lado da minha. Era impossível ter pesadelos, pelo menos não naquela noite, naquele instante perfeito.
No dia seguinte, era incrível o meu bom humor, de modo que sorria até mesmo para Mádi Brocklehurst. A nossa primeira aula do dia era herbologia. A Prof.ª Sprout era uma bruxa baixinha e gorducha, que nos ensinava tal matéria.
- Nunca ouvi falar em herbologia - disse Ana, franzindo a testa ao ler os horários.
- É onde aprendemos a cuidar de plantas e fungos estranhos, e descobrimos para que são usados - respondi.
As aulas do primeiro ano se passavam na estufa número um. Haviam outras estufas também, mas eram para anos mais avançados. A Profa. Sprout nos guiou até a estufa 1 e nos indicou bacias cheias de lama, para que ficássemos analisando-as. Disse para montarmos grupos de três, e cada trio iria ficar com uma bacia.
- Muito bem, já formaram os trios? - gritou a Prof.ª Sprout aos alunos, que aos poucos iam se agrupando.
Naturalmente, fiquei com Ana, mas estávamos com dificuldade em arranjar um terceiro membro para o grupo.
- Alguém sem grupo? - gritou mais uma vez a Prof.ª
Ouviu-se um "eu" no fundo da estufa. Todos olharam para ele: um garotinho gorducho de cabelo encaracolado e muito louro usando uma capa púrpura, que estendeu o bracinho gordo.
- Bem, então você vai para o grupo das meninas ali - e apontou para nós.
O garoto veio em nossa direção, desajeitado. Dei um sorrisinho sem jeito para ele, mas foi difícil Ana ao menos forçar um.
A Prof.ª Sprout nos explicou como "colher" os fungos presentes nas bacias e perguntei ao garoto como era seu nome.
- É Roger Springs, vim para Hogwarts de última hora, quando me inscrevi já haviam selecionado os alunos novos - respondeu ele, meio tímido.
- Bom, eu sou Susy e esta é Ana - eu disse.
Olhei para Ana. Ela nem sequer olhou para a cara de Roger, e nem depois do cutucão que dei nela ela conseguiu dar um sorriso ao menino. Que será que havia com ela? Por que será que estava agindo daquele jeito?
Quando acabou o trabalho na estufa, voltamos para o castelo para a aula seguinte: História da Magia. Diziam que era a mais chata de todas as aulas, e os boatos não erravam. O Prof. Binns era um fantasma, mas agia como se não soubesse disso. Quase dormi na aula, debruçada sobre o livro, quando tocou o sinal anunciando o almoço.
Ao sentarmos na mesa da Lufa-Lufa para começar a comer, me dirigi à Ana seriamente:
- Ana, o que foi que deu em você aquela hora? - perguntei.
- Não sei do que está falando - murmurou ela, tentando evitar o meu olhar ao se servir de empadão de frango.
- Mas é claro que sabe! Na estufa, a sua reação com o Roger...
- Não quero saber daquele tal Roger, está bem? Podemos mudar de assunto? - interrompeu-me Ana, mau-humorada.
- Por que está tão aborrecida? Diga-me, eu só quero ajudar...
- Eu não quero a sua ajuda! - rosnou ela - E agora se me der licença, perdi o apetite.
E se retirou, batendo o pé, as orelhas vermelhas. Parecia que, a qualquer momento, iria sair fumaça de sua cabeça.
Sem entender nada, me pus a comer, a cabeça baixa de tristeza.
- Ela vai acalmar, tenha confiança nisso - uma voz falou ao meu lado. Era Justino Finch-Flechley. Ele estava no meu ano, possuía cabelos encaracolados e olhos cor de mel - Só está com ciúmes.
- Espere aí, isso não faz o menor sentido! Por que estaria com ciúmes? - indaguei.
- Por que ela acha que você estava dando mais atenção ao Roger do que à ela.- Falou Justino.
- Do que você está falando? E como você sabe disso?
- Tudo bem, tem alguma teoria melhor para justificar o acesso de raiva dela?- perguntou ele, erguendo as sombrancelhas com ar de sabe-tudo.
Eu não tinha pensado nisso antes. Para que ter ciúmes, se estamos falando do Roger? Ana dá de dez à zero naquele gordinho de meia tigela. Na minha opinião, ter ciúmes por causa daquilo era a coisa mais infantil que uma pessoa poderia ter feito até agora.
- Vá falar com ela - sugeriu Justino.
E foi exatamente o que eu fiz. Saí do Salão Principal, e fui direto para o dormitório da Lufa-Lufa, que era o lugar mais provável em que Ana poderia estar. Ao chegar lá, entrei de fininho pela porta, e lá estava ela, resmungando baixinho para si mesma.
- Bom, eu sou Susy e esta é Ana - murmurou ela, fazendo uma péssima imitação da minha voz.
- Sabe, eu só estava tentando ser amigável - interrompi-a. Ana quase pulou de susto, olhando assustada na minha direção. Depois de se recuperar, voltou a fechar a cara para mim.
Sentei me ao seu lado. Ela continuou olhando para baixo, sem mostrar nenhum indício de felicidade.
- Não esperava que viesse - falou finalmente ela, baixinho.
- Bem, é isso que as melhores amigas fazem. Seguem umas as outras em busca de ajudá-las.
- Já disse que não preciso da sua ajuda. - grunhiu ela.
- Olha, eu só vim dizer que não precisa ficar com ciúmes.- falei, não direcionando o olhar para ela.
- Quem disse que estou com ciúmes? - perguntou ela.
- Se não é ciúmes, então me fala o que é que te intriga tanto.
Ouve uma pausa momentânea. Finalmente Ana quebrou o silêncio, desabafando:
- Está certo, não gostei da atenção que você dava ao Roger - ela falou a palavra "Roger" como se fosse a palavra mais desprezível do mundo - Você deve estar achando que eu pareço um bebezinho por pensar assim. Mas parecia que você tinha me deixado pra lá e só ficava conversando com ele.
Eu queria falar é verdade, esta é a atitude mais ridícula que alguém já teve, mas engoli as palavras. Em vez disso falei:
- Na verdade, eu só não estava conversando muito com você por que você simplesmente fechou a cara para o mundo, e eu não entendi o por quê. Naquela hora, no Salão Principal, eu só estava tentando descobrir o que eu não tinha entendido. Você mal conhecia o garoto e nem se esforçou para lhe dar um sorrisinho. Eu só estava tentando ser educada com ele. - respondi.
- Me desculpe, Susy. Eu interpretei mal as suas intenções.
E nós duas nos abraçamos como amigas felizes novamente.
Na manhã seguinte, acordei cedo. Ouvi passos imediatamente até a porta e, quando vi, umas três garotas estavam com um uniforme esquisito e roxo. Mas não eram uniformes comuns: eram uniformes de quadribol.
Continua...
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